Título em
Portugal: Dancer in the Dark
Realizador: Lars von Trier
Ano: 2000
País:
Dinamarca
Argumentista:
Lars von Trier
Fotografia:
Robby Müller
Elenco
principal: Björk, Catherine Deneuve, David Morse, Peter Stormare, Cara Seymour
Duração: 2
horas e 20 minutos
Vívido, frustrante, incrivelmente belo e às vezes
avassaladoramente brutal, "Dancer in the Dark" é um filme difícil de encaixar
na nossa cabeça.
Se espectador o ponderar pelos padrões de Hollywood, provavelmente
ficará desiludido, porque não é estereotipado - excepto na medida em que a
tragédia humana é ela própria estereotipada na sua inevitabilidade e nos seus
padrões de traição e perda.
O segredo está,
portanto, em contar. E, ao recontextualizar o musical como uma fantasia
neurótica (no espírito de "Pennies from Heaven" e "The Singing
Detective", com toda a música e dança a processar-se na mente de uma
personagem), o realizador Lars Von Trier conseguiu empreender uma formidável
nova narrativa de comoventes temas clássicos.
O resultado é disperso, desajeitado e muitas vezes
fascinante.
Bjork é a figura central como Selma, uma imigrante checa
presa num rural Noroeste do Pacífico. Lutando contra a cegueira hereditária, ela
trabalha longas horas numa fábrica na esperança de eventualmente conseguis pagar
a operação que irá salvar a visão do seu filho.
Ela é uma heroína problemática – de bom coração, mas tímida,
claramente esforçada, mas patologicamente orgulhosa para aceitar qualquer caridade.
Os amigos de Selma amam-na desesperadamente, mas ela raramente os deixa aproximarem-se.
Cathy (Catherine Deneuve como a amiga obstinada e de coração de manteiga), Jeff
(Peter Stormare, um pedaço de madeira inarticulado e possível pretendente), o
casal Linda (Cara Seymour) e Bill (David Morse, a própria personificação da
banalidade do mal) - todos eles caem na órbita em torno desta mulher difícil, e
as forças de atracção resultantes são longas, lentas e finalmente
cataclísmicas.
A primeira meia hora do filme, com seu trabalho de câmara
manual no estilo Dogma 95 e nuances emocionais densamente elaboradas, é lúgubre
e até um pouco soporífica. Temos a sensação de estar imersos numa história a
processar-se, mas apenas vamos tendo vislumbres de algo muito maior, um drama
subliminar que obviamente vai explodir. Mas quando? E como?
Apesar de tudo isso, Bjork interpreta Selma intensamente, com
as suas falas mansas e emocionalmente evasivas, parecendo quase autista. Dá
vontade de protestar com o filme …
As coisas realmente começam a atear-se com o primeiro número
musical, com uma música alucinante e uma coreografia nascida do barulho e da
rotina de uma movimentada fábrica. A música de Bjork é, numa palavra,
fantástica, e as tão comentadas 100 câmaras de Von Trier são utilizadas de
maneira impressionante, capturando ângulos peculiares e fluidos detalhes
coreográficos.
A cada evolução subsequente da história e a de cada número
musical, surpreendente de intensidade e de clímax, somos atraídos mais e mais
profundamente. Quando o inevitável se torna claro, estamos em total negação,
mesmo sabendo que é inútil esperar que o destino não tenha o que lhe é devido.
Apesar da presença de superestrelas fotogénicas como Bjork e
Catherine Deneuve, este filme não é sobre pessoas bonitas – mas sim sobre a
beleza das pessoas. Von Trier mantém as suas personagens estranhas, desajeitadas,
com comportamentos quase opressivamente medianos. Mas é tudo uma simulação. A
mensagem final de "Dancer in the Dark" é de transcendência, da
capacidade dos "pequenos" em superar as expectativas banais e
claustrofóbicas da vida quotidiana e - para o bem ou para o mal - alcançar
estados de ser extraordinários que mudam a vida das pessoas em seu redor.
As fugas musicais de Selma são escapismo puro e
transformador. Sem eles, a sua vida, assim como o próprio filme, seria
implacável, sombria, aterrorizante e quase desprovida de redenção. O que salva
Selma – e todos nós, certo? - é nada menos que o amor verdadeiro, a vontade
pura e a livre imaginação.
Texto (adaptado) de Josh Wilson
SFGate
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