Título em português: A Paixão de Joana d’Arc
Realizador: Carl Theodor Dreyer
Ano: 1928
País: França
Argumento: Carl Theodor Dreyer
segundo
o romance “Jeanne d’Arc” (1925) de Joseph Delteil
Fotografia: Rudolph Maté
Elenco principal: Renée Falconetti, Eugéne Silvain, André Berley, Maurice
Schutz, Antonin Artaud
Duração: 1 hora e 54 minutos
Tendo em conta a data em que foi
realizado, “La Passion de Jeanne d’Arc” situa-se no apogeu (e limite) do cinema
mudo. Os longos textos [intertítulos] testemunham esta impaciência, e
imagina-se este filme sonorizado, como os russos sonorizaram “Potemkine”. Em
compensação, a composição das imagens, o rigor da montagem condensam todas as
competências adquiridas com o cinema mudo e todas as suas possibilidades de
expressão.» (Chris Merker)
Dreyer estava interessado na vida de Joana
d'Arc desde a sua canonização em 1924. A sua ambição não era fazer um simples
filme de época, embora tenha estudado a fundo os documentos relativos ao
processo de reabilitação: queria "interpretar um hino ao triunfo da alma
sobre a vida".
Necessitava de encontrar a atriz capaz de
encarnar a mártir. (…). E foi Renée Falconetti, uma estrela do teatro de
“boulevard”, que finalmente recaiu a sua escolha:
“Fui vê-la uma tarde e conversamos por uma
ou duas horas. Eu tinha-a vistono teatro. Um pequeno teatro de “boulevard” cujo
nome esqueci. Ela actuava numa comédia ligeira e estava muito elegante, um
pouco vaporosa mas charmosa (...) Então eu disse-lhe que gostaria de fazer um
ensaio fotográfico com ela no dia seguinte. “Mas sem maquiagem”, acrescentei:
“com o rosto completamente nu”. Então ela chegou no dia seguinte, já
disponível. Tirou a maquiagem e fizemos os testes, e encontrei no seu rosto
exactamente o que procurava para a Joana D'Arc: uma mulher rústica, muito
sincera e que também fosse uma mulher de sofrimento (p.127, 128).
Este rosto de dor tornou-se o próprio tema
do filme, a superfície sobre a qual Dreyer poderia revelar a Paixão da Joana
D'Arc histórica, mas também o verdadeiro rosto da humanidade sofredora. O
entendimento entre o autor e a sua atriz foi perfeito, apesar dos sacrifícios
que ela teve de aceitar (teve de rapar o cabelo, a intimidade que o seu rosto
tinha de revelar), tal era a ideia elevada de que os dois artistas concebiam
para o trabalho que queriam fazer, tão forte era a intuição que só se
aproximariam da beleza mais intacta à custa da nudez mais crua.
A estilização dos enquadramentos bem
demarcados, a abstracção dos cenários, reduzidos ao essencial e como que
absorvidos pela nudez dos rostos, a força emocional da montagem, fazendo com
que se sucedam os planos da vítima e os planos de seus algozes, tudo contribuiu
para fazer deste filme único uma obra comovente. O uso muito sistemático de
close-ups durante o julgamento de Jeanne, elemento determinante do estilo do
filme, suscitou a admiração do público e depois o enorme sucesso crítico que o
filme viria a alcançar:
“Joana D'Arc foi algo de importante para
mim. Antes, eu nunca tinha feito um filme tão importante. Contudo, tive as mãos
livres, fiz absolutamente o que queria e, na altura, fiquei muito satisfeito
com o que tinha feito (...) Porque para mim é acima de tudo a técnica do
processo-verbal que era determinante. Há partida existia esse processo com as
suas vias próprias, com sua própria técnica, e é essa técnica que tentei
transmitir no filme. Havia as perguntas e havia as respostas, muito
curtas, muito duras. Portanto, não havia outra solução senão colocar grandes
planos atrás das réplicas. Cada pergunta, cada resposta exigia naturalmente um
close-up. Era a única possibilidade. Tudo isso decorreu da técnica do
processo-verbal. Além disso, o resultado dos close-ups era que o espectador
recebia os mesmos choques que Jeanne recebia com as perguntas e como era
torturada por elas. E, de facto, era realmente minha intenção obter este
resultado.”
Cineclube de Caen
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