domingo, 4 de fevereiro de 2024

The Pianist de Roman Polanski


 

Título em português: O Pianista

Realizador: Roman Polanski

Ano: 2002

País: França, Reino Unido, Alemanha e Polónia

Argumento: Ronald Harwood

            segundo a autobiografia de Wladyslaw Szpilman, intitulada “Das wunderbare Überleben” (e traduzida para português com o título “O Pianista” e editado pela Ed. Presença)

Fotografia: Pawel Edelman

Elenco principal: Adrien Brody, Thomas Kretschmann, Frank Finlay, Maureen Lipman, Emilia Fox

Duração: 2 horas e 23 minutos

 

(…)

 

Escrito por Ronald Harwood a partir do livro autobiográfico de Wladyslaw Szpilman, “O Pianista” tem início justamente no momento em que a Alemanha invade a Polónia e começa a decretar leis anti-semitas: no início, os judeus são proibidos de andar nas ruas da cidade (no caso, Varsóvia) e de se sentarem nos bancos das praças. Em seguida, são obrigados a usar, nos braços, faixas ostentando a Estrela de David e, mais tarde, são “depositados” no gueto de Varsóvia. É neste contexto que conhecemos a família do pianista: cultos e relativamente abastados, os Szpilman acreditam que a Alemanha logo será derrotada, já que França e Inglaterra acabam de declarar guerra a Hitler. Assim, é com grande terror que acabam por se submeter às constantes humilhações impostas pelos nazis enquanto lutam para ficarem unidos – e estas humilhações parecem não ter fim, já que os militares alemães parecem dispostos a realizar novas atrocidades a todo o momento, como na cena em que interrompem o jantar de uma família e, para evitar o incómodo de carregar um inválido pelas escadas, resolvem atirá-lo pela janela.

Aliás, eu poderia facilmente preencher toda esta análise apenas com descrições das barbaridades vistas ao longo de “O Pianista”, (…) pois o filme não poupa o espectador de ver, nas ruas do gueto, os cadáveres em decomposição de crianças vitimadas pelo frio e pela fome. No entanto, ainda mais assustador é constatar que, com o tempo, os habitantes do gueto passam a nem prestar atenção aos corpos, como se estes já fizessem parte da trágica paisagem (…)

A direcção de “O Pianista, aliás, é primorosa: ao longo dos 143 minutos de projecção, Polanski consegue realizar uma proeza dificílima em produções deste tipo, levando o espectador a sentir o lento transcorrer dos anos sem que, com isso, a narrativa torne-se episódica ou artificial. E mais: ao retratar a jornada de Szpilman, o cineasta ilustra com competência as dificuldades que este enfrenta para se manter vivo, já que comida era artigo de luxo nos tempos de guerra – assim, sempre que chega num novo esconderijo, o protagonista é obrigado a procurar algo para comer e beber, mesmo que isso implique em mergulhar o rosto num balde cheio de dejectos humanos.

Enquanto isso, Adrien Brody oferece uma performance absolutamente inesquecível como Szpilman, encarnando com incrível realidade a decadência física e psicológica do personagem ao longo dos anos: de sua sofisticação inicial até se transformar na figura animalesca vista no fim da guerra. Passivo ao extremo, o pianista não é um herói na acepção habitual da palavra, já que sua postura frente às dificuldades jamais é a de alguém disposto a lutar pelos seus ideais ou mesmo pela sua vida: durante toda a duração do filme, Szpilman é conduzido de um lado para o outro de Varsóvia por amigos e aliados, mas jamais questiona os planos que lhe são apresentados. Aliás, a impressão é a de que o sujeito se mantém vivo mais por inércia do que por persistência: ao ficar preso por duas semanas num apartamento sem comida, por exemplo, ele nem sequer tenta encontrar uma saída para o problema, limitando-se a deitar-se num sofá e agonizar até que alguém venha ajudá-lo.

Presente em praticamente todas as cenas de “O Pianista”, Brody carrega o filme com uma força impressionante (…): Wladyslaw Szpilman é um homem absolutamente comum, não possuindo `tiques` ou outras características que o transformem numa personalidade única, o que certamente dificultou ainda mais o trabalho do actor.

Mas as qualidades de “O Pianista” não param por aí: a direcção de arte (obra de Sebastian T. Krawinkel) é impressionante, recriando com cuidado o gueto de Varsóvia e também as ruínas em que a cidade se transformou ao longo da guerra – e a cena em que Szpilman vê o resultado dos bombardeamentos pela primeira vez é impactante, já que a destruição de Varsóvia acaba por servir como reflexo da própria degradação do personagem. Também merecem destaque a sombria e melancólica fotografia de Pawel Edelman e os figurinos de Anna B. Sheppard, que ajudam Polanski a compor o retrato daquela triste época.

Sem se preocupar em criar momentos melodramáticos para arrancar lágrimas do espectador, “O Pianista” é um filme triste sem que, para isso, precise de ser emocionante. A tristeza provocada por esta história não vem de momentos artificialmente criados através da utilização da banda sonora ou de discursos cuidadosamente escritos, mas sim da constatação assustadora de que os seres humanos são capazes de realizar atrocidades inimagináveis – e o fato do protagonista desta produção ser um pianista somente contribui para salientar este facto, já que estabelece um forte contraste entre a beleza criativa das Artes e a monstruosidade insana da Guerra.

Pablo Villaça

 

Blog Cinema em Casa

Texto adapatado

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