Título em
português: O Pianista
Realizador: Roman Polanski
Ano: 2002
País:
França, Reino Unido, Alemanha e Polónia
Argumento:
Ronald Harwood
segundo a autobiografia de Wladyslaw
Szpilman, intitulada “Das wunderbare Überleben” (e traduzida para português com
o título “O Pianista” e editado pela Ed. Presença)
Fotografia:
Pawel Edelman
Elenco
principal: Adrien Brody, Thomas Kretschmann, Frank Finlay, Maureen Lipman,
Emilia Fox
Duração: 2
horas e 23 minutos
(…)
Escrito por Ronald
Harwood a partir do livro autobiográfico de Wladyslaw Szpilman, “O Pianista” tem início
justamente no momento em que a Alemanha invade a Polónia e começa a decretar
leis anti-semitas: no início, os judeus são proibidos de andar nas ruas da
cidade (no caso, Varsóvia) e de se sentarem nos bancos das praças. Em seguida,
são obrigados a usar, nos braços, faixas ostentando a Estrela de David e, mais
tarde, são “depositados” no gueto de Varsóvia. É neste contexto que conhecemos
a família do pianista: cultos e relativamente abastados, os Szpilman acreditam
que a Alemanha logo será derrotada, já que França e Inglaterra acabam de
declarar guerra a Hitler. Assim, é com grande terror que acabam por se submeter
às constantes humilhações impostas pelos nazis enquanto lutam para ficarem
unidos – e estas humilhações parecem não ter fim, já que os militares alemães
parecem dispostos a realizar novas atrocidades a todo o momento, como na cena
em que interrompem o jantar de uma família e, para evitar o incómodo de
carregar um inválido pelas escadas, resolvem atirá-lo pela janela.
Aliás, eu poderia
facilmente preencher toda esta análise apenas com descrições das barbaridades
vistas ao longo de “O Pianista”,
(…) pois o filme não poupa o espectador de ver, nas ruas do gueto, os cadáveres
em decomposição de crianças vitimadas pelo frio e pela fome. No entanto, ainda
mais assustador é constatar que, com o tempo, os habitantes do gueto passam a
nem prestar atenção aos corpos, como se estes já fizessem parte da trágica
paisagem (…)
A direcção de “O Pianista”, aliás, é
primorosa: ao longo dos 143 minutos de projecção, Polanski consegue realizar
uma proeza dificílima em produções deste tipo, levando o espectador a sentir o
lento transcorrer dos anos sem que, com isso, a narrativa torne-se episódica ou
artificial. E mais: ao retratar a jornada de Szpilman, o cineasta ilustra com
competência as dificuldades que este enfrenta para se manter vivo, já que
comida era artigo de luxo nos tempos de guerra – assim, sempre que chega num
novo esconderijo, o protagonista é obrigado a procurar algo para comer e beber,
mesmo que isso implique em mergulhar o rosto num balde cheio de dejectos
humanos.
Enquanto isso,
Adrien Brody oferece uma performance absolutamente inesquecível como Szpilman,
encarnando com incrível realidade a decadência física e psicológica do
personagem ao longo dos anos: de sua sofisticação inicial até se transformar na
figura animalesca vista no fim da guerra. Passivo ao extremo, o pianista não é
um herói na acepção habitual da palavra, já que sua postura frente às
dificuldades jamais é a de alguém disposto a lutar pelos seus ideais ou mesmo pela
sua vida: durante toda a duração do filme, Szpilman é conduzido de um lado para
o outro de Varsóvia por amigos e aliados, mas jamais questiona os planos que
lhe são apresentados. Aliás, a impressão é a de que o sujeito se mantém vivo
mais por inércia do que por persistência: ao ficar preso por duas semanas num
apartamento sem comida, por exemplo, ele nem sequer tenta encontrar uma saída
para o problema, limitando-se a deitar-se num sofá e agonizar até que alguém
venha ajudá-lo.
Presente em
praticamente todas as cenas de “O
Pianista”, Brody carrega o filme com uma força impressionante (…): Wladyslaw
Szpilman é um homem absolutamente comum, não possuindo `tiques` ou outras
características que o transformem numa personalidade única, o que certamente
dificultou ainda mais o trabalho do actor.
Mas as qualidades
de “O Pianista” não
param por aí: a direcção de arte (obra de Sebastian T. Krawinkel) é
impressionante, recriando com cuidado o gueto de Varsóvia e também as ruínas em
que a cidade se transformou ao longo da guerra – e a cena em que Szpilman vê o
resultado dos bombardeamentos pela primeira vez é impactante, já que a
destruição de Varsóvia acaba por servir como reflexo da própria degradação do
personagem. Também merecem destaque a sombria e melancólica fotografia de Pawel
Edelman e os figurinos de Anna B. Sheppard, que ajudam Polanski a compor o
retrato daquela triste época.
Sem se
preocupar em criar momentos melodramáticos para arrancar lágrimas do
espectador, “O Pianista” é
um filme triste sem que, para isso, precise de ser emocionante. A tristeza
provocada por esta história não vem de momentos artificialmente criados através
da utilização da banda sonora ou de discursos cuidadosamente escritos, mas sim
da constatação assustadora de que os seres humanos são capazes de realizar
atrocidades inimagináveis – e o fato do protagonista desta produção ser um
pianista somente contribui para salientar este facto, já que estabelece um
forte contraste entre a beleza criativa das Artes e a monstruosidade insana da
Guerra.
Pablo
Villaça
Blog Cinema em Casa
Texto adapatado
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